A importância do tratamento da cama do aviário
Daniele Telles, Analista Técnica
A escolha correta do material da cama e o manejo adequado são itens importantes na avicultura industrial, uma vez que é onde o frango permanecerá grande parte da vida e que afetará diretamente os parâmetros produtivos, saúde e bem-estar. A cama, além de incorporar os dejetos, tem a função de absorver a umidade, fornecer isolamento térmico e proporcionar uma superfície confortável, a fim de reduzir ou evitar a incidência de lesões em regiões como peito, joelho e coxim plantar.
A substituição da cama a cada lote de frangos aumenta o custo da produção avícola em cerca de 77% (Marcolin, 2006); assim, no Brasil, a reutilização da cama de frango é bastante comum, e pode acontecer por até 6 lotes de frango no galpão. Essa prática visa, principalmente, reduzir os custos de produção e diminuir o impacto ambiental da atividade. No fim, essa cama é descartada ou reaproveitada sendo destinada à agricultura como fonte de adubação.
Devido à presença de fezes, ração, temperatura e umidade elevadas, a cama apresenta condições especiais para o desenvolvimento de microrganismos patogênicos, como Salmonella spp., Clostridium spp., Escherichia coli, que podem provocar doenças às aves. É o caso, por exemplo, da colibacilose. A colibacilose está relacionada principalmente a cepas de Escherichia coli APEC e se caracteriza por uma síndrome na qual se observam lesões em órgãos, como sacos aéreos, fígado (perihepatite) e coração (pericardite), levando à rejeição de carcaças de frango no abatedouro (Santiago et al., 2019).
A incidência de insetos é outro ponto de atenção referente à qualidade da cama, com destaque para o cascudinho (Alphitobius diaperinus). Esse inseto praga é vetor de vários patógenos, incluindo a Salmonella spp, e influencia diretamente na conversão alimentar das aves, afetando o crescimento e o ganho de peso (Simões da Silva, 2022).
Além disso, essas condições podem levar a altos níveis de amônia no interior dos galpões. O efeito do gás amônia é amplamente citado na avicultura. Quando as aves são expostas a níveis altos do gás, ficam mais predispostas a doenças respiratórias, aumentam os riscos de infecções secundárias às vacinas e os processos fisiológicos de trocas gasosas são prejudicados (De Oliveira et al., 2003). Concentrações altas de amônia também podem provocar lesões oftálmicas, como a ceratoconjuntivite, que afeta a córnea e pode causar cegueira (Oro, 2014).
Neste contexto, o tratamento das camas durante o intervalo entre lotes, no intuito de melhorar sua qualidade física, química e microbiológica, é fundamental para garantir a produtividade e sanidade das aves. E conhecer os fatores que afetam a qualidade da cama, como as características do material, umidade e pH, é importante para a tomada de decisão de quais tratamentos utilizar.
No Brasil, os métodos mais utilizados como tratamento de cama são a fermentação em leira, fermentação plana e o uso de aditivos químicos, como sulfato de alumínio, gesso agrícola e cal.
No método de fermentação, em leira ou plana, a cama é amontoada e coberta com lona plástica para que ocorra a fermentação. A combinação de alta temperatura e liberação de dióxido de carbono, decorrentes do processo de decomposição da matéria orgânica, aliadas à queda do pH, promovem a redução da carga microbiana da cama. O processo auxilia, ainda, no controle de insetos, como os cascudinhos e moscas.
No método químico, o objetivo é adicionar produtos à cama visando a redução do pH com o objetivo de criar um ambiente pouco favorável para o crescimento de microrganismos patogênicos. O pH mais propício para a multiplicação desses microrganismos se encontra entre 6 e 9 (Silva, 2011). Além de diminuir a carga microbiana, a redução do pH também contribui para a redução da amônia (NH3) volatizada. Esse efeito está relacionado ao aumento da concentração de íons H+, que favorece a formação de amônio (NH4+), que é uma forma não volátil (França et al., 2014).
Promover boa ventilação e circulação de ar, com o uso de ventiladores e cortinas laterais, também é importante para evitar o acúmulo de umidade e remover a amônia do ambiente.
Estabelecer um tratamento de cama eficiente para reduzir a carga microbiológica, evitar a perpetuação de patógenos e doenças de um lote para outro e controlar os insetos do aviário, são essenciais para a saúde e o desempenho das aves e influenciam diretamente nos lucros da atividade.
Fonte: Banco de dados Cinergis. Aplicação de aditivos para tratamento de cama.
Referências
DE OLIVEIRA, M. C. et al. Dry matter content, pH and volatilized ammonia from poultry litter treated or not with different additives. Revista Brasileira de Zootecnia, v. 32, n. 4, p. 951–954, 2003.
FRANÇA, L. G. F. et al. Caracterização de fatores que influenciam a emissão de amônia pelos dejetos de galinhas poedeiras e proposição de um score para o potencial máximo de emissão. XLIII Congresso Brasileiro de Engenharia Agrícola – CONBEA, 2014.
MARCOLIN, S. Processos de tratamento para reutilização de cama de aviário: aspectos econômicos. In: CONFERÊNCIA APINCO DE CIÊNCIA E TECNOLOGIA AVÍCOLAS, 2006, Santos. Anais… Campinas: FACTA, 2006.
ORO, C.; PRADO, E. Influência da amônia proveniente da cama aviária sobre o bem-estar de frangos de corte. Veterinária em Foco, v.12, n.1, p. 49-63, 2014.
SANTIAGO, G.; PASSARINI, J. F.; CERQUEIRA, J. A.; DA CUNHA, H. V. F.. Avaliação da reutilização de cama de frango sobre a condenação de carcaças por colibacilose. Pubvet, [S. l.], v. 13, n. 08, 2019. DOI: 10.31533/pubvet.v13n8a392.1-6. Disponível em: http://ojs.pubvet.com.br/index.php/revista/article/view/788. Acesso em: 3 ago. 2023.
SILVA, V.S. Estratégias para reutilização da cama de aviário. Conferência Facta, de ciência e tecnologia avícolas, Santos, SP, 2011.
SIMÕES DA SILVA, E.; BRITO RODRIGUES, A. L. de.; MACHADO CUNICO, J.; SIMÕES PEREIRA, S.; SILVA COSTA, M.; SCHMIDT-CAVALHEIRO, W. C.; VENDRUSCOLO, J.; SOARES DE AGUIAR, I.; MIOSSI RONDELLI, V.; FERREIRA, E. CASCUDINHO E FRANGOS DE CORTE: INFLUÊNCIA NO DESEMPENHO PONDERAL. RECIMA21 – Revista Científica Multidisciplinar – ISSN 2675-6218, [S. l.], v. 3, n. 6, p. e361508, 2022. DOI: 10.47820/recima21.v3i6.1508. Disponível em: https://recima21.com.br/index.php/recima21/article/view/1508. Acesso em: 3 ago. 2023.